Em mais uma audiência pública da Comissão Anísio Teixeira de Memória e Verdade, realizada na manhã desta sexta-feira (26), a socióloga e defensora dos direitos humanos Sônia Hypólito e o professor e jornalista Aylê-Salassié Filgueiras Quintão deram seus depoimentos sobre os fatos ocorridos na universidade durante os primeiros anos do período ditatorial iniciado em 1964. Ambos são ex-alunos da UnB, participaram do movimento estudantil na instituição e lutaram contra a repressão militar que se instalava no país.

 

Marcelo Jatobá/UnB Agência

 

Estudante da Faculdade de Comunicação entre 1965 e 1970, Aylê-Salassié Filgueiras contou das demissões assinadas pelo reitor Laerte Ramos de Carvalho, no início de seu mandato, em 1965, e afirmou as conseqüências que a atitude do professor formado na USP trouxe às graduações em Comunicação da UnB. “O curso de cinema foi irrevogavelmente fechado”, declarou em razão da demissão do corpo docente do bacharelado.

À época, Aylê-Salassié foi presidente do Diretório Acadêmico de Comunicação de Massas (Dacma). O grupo estava conectado com as grandes esferas do movimento estudantil na instituição e era contrário a atuações da administração superior e da coordenação do curso. Em resposta ao seu posicionamento, o jornalista foi chamado em sala de aula para depor em inquérito policial militar. “Fiquei um dia e meio por lá. O evento ficou muito marcado, porque levou mais de 10h de duração só comigo”, declarou.

A defensora dos direitos humanos Sônia Hypólito ingressou na Universidade de Brasília com o intuito de estudar Jornalismo, mas deixou a graduação para cursar Geologia. A decisão da estudante acabou por aproximá-la do movimento estudantil e do líder de militância Honestino Guimarães, que se graduava no mesmo curso. “Nosso convívio aconteceu entre 1967 e 1968. Com ele, aprendi muita coisa. Era um grande lutador, um dos heróis desse país”, pontuou a socióloga.

IEDA DELGADO - Relatos sobre desaparecimentos políticos marcaram o último encontro da Comissão Anísio Teixeira. Ieda Santos Delgado foi estudante do curso de Direito da UnB e sua passagem pela instituição a aproximou da política, integrando-a na luta contra a ditadura.

Na instituição, Ieda não foi liderança estudantil de evidência, mas sua atuação frente ao regime militar foi repreendida com o seu assassinato. Em sua certidão de óbito consta o último dia em que foi vista, 11/04/1974, além de dados como: falecida em hora e lugar ignorados e sepultada em lugar ignorado.

Sônia Hypólito e Aylê-Salassié Filgueiras Quintão contaram da relação com a militante. “A Ieda e eu éramos muito amigas. Eu sempre dormia na casa dela, e conversávamos da vida. A política não era seu foco prioritário. Ela era uma aluna que tinha consciência política, mas que não foi para a ação na UnB nem no movimento estudantil”, afirmou Sônia.

Em 1969, ao deixar a capital federal, Sônia afirma que perdeu o contato com a amiga. “Ela seguiu um rumo, eu outro”. Sônia ficou sabendo do falecimento de Ieda anos mais tarde. No entanto, para os familiares de Ieda, a imagem de Sônia ficou associada à ligação da jovem com a militância política. “A mãe da Ieda passou a me acusar de responsável pela sua morte. Eu que coloquei política na cabeça da Ieda. Mas quem a matou foi a polícia”, argumentou emocionada.

COMISSÃO - A Comissão Anísio Teixeira de Memória e Verdade foi criada em 2012 e apura violações de direitos humanos ocorridas entre 1964 e 1988. Em novembro do ano passado, a Comissão assinou termo de cooperação com a Comissão Nacional da Verdade. O grupo tem levantado e sistematizado informações desde o seu lançamento, quando começou a verificar as causas de morte de Anísio Teixeira, um dos criadores da UnB.